quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Não foi por falta de aviso

O excelente site O Antagonista  lembrou, hoje, do livro de Ali Kamel, “Sobre o Islã”, onde o autor (sim, é o diretor de Jornalismo da Globo) “discorre sobre as raízes da religião muçulmana, as suas afinidades com o judaísmo e o cristianismo e as divisões que ocorreram no seu interior”, nas palavras de Mário Sabino, um dos três responsáveis pelo site.

Tenho o livro desde 2007 e, ao lê-lo, aprendi, por exemplo, que muçulmanos, cristãos e judeus pertencem, digamos assim, a um mesmo tronco religioso, que se separaram e se tornaram inimigos por séculos. Mas Ali Kamel vai além e mostra as origens do terrorismo islâmico de forma quase didática.

Escreve ele: “A maioria dos muçulmanos da maior parte dos países muçulmanos não se deixa enganar pelo radicalismo religioso, mas o terreno passa a ser fértil para que uma massa de desesperados, sobretudo jovens, veja nisso a solução para seus males. E isso leva parte da juventude às práticas terroristas”.  

E explica: “Porque nas sociedades muçulmanas, hoje, a tomada de poder é o coração do programa fundamentalista. Eles sabem que fundamentalista sem poder político é um leão sem dentes: não apedreja, não fere, não mata, não obriga a usar o véu; apenas prega a sua visão estreita do mundo.”

Mario Sabino destaca no site os três parágrafos finais do livro, que mostram como a Europa se enganou em suas políticas de combate ao terror: “Os Estados Unidos acudiram a Europa três vezes no século passado, repito, a um enorme custo de vidas e dinheiro, sempre a defendendo de ameaças à liberdade. Na primeira vez em que, atacado, precisou da Europa, ouviu um 'não'. Reino Unido e outros poucos países mandaram, no máximo, vinte mil soldados. Houvesse de fato uma solidariedade intensa com os Estados Unidos, o número de homens teria sido imensamente maior, e a situação hoje, provavelmente, estaria sob controle.

A Europa evita tomar essa atitude temendo se tornar um alvo. É um engano, porque ela já é um alvo.

Tempos difíceis os nossos. Se o outro lado conhece bem os seus objetivos, e é capaz de morrer por eles, nós, a parte aparentemente racional do mundo, não percebemos sequer de que lado estamos."

Como se vê, há oito anos, essa visão de que o fanatismo islâmico iria vitimar a Europa já era clara para quem sabia ler a realidade muçulmana. A Europa errou feio ao não adotar medidas mais rígidas de controle de suas fronteiras e também de vigilância interna, sem contar a pouca cooperação com os EUA.

No fim do livro, pouco antes do trecho publicado em O Antagonista, há uma espécie de premonição de Ali Kamel.

Sob o título “O que será do futuro?”, ele escreve: “Não importa quem ganhe as eleições de 2008, se democratas ou republicanos (ganharam os democratas, como se sabe), creio que os Estados Unidos tudo farão para organizar a bagunça que está no Iraque. Eles sabem que uma derrota total naquele conflito dará uma confiança extremada aos totalitários do Islã, com consequências funestas. Toda a estratégia de evitar que os terroristas tenham um Estado atrás de si, uma base de poder, terá ido por água abaixo: democratas e republicanos sabem disso.”

Mas Barak Obama, embora soubesse, parece que se ateve a gerar mais confusão do que impedir que o Iraque se tornasse uma bagunça ainda maior sob sua presidência. A “primavera árabe” que foi mais uma farsa que levou terroristas ao poder, foi saudada no Ocidente como vitória da democracia contra os tiranos árabes. Ledo engano, e não foi por falta de aviso de analista inteligentes.  Os resultados estão aí: os totalitários do Islã agora têm um “Estado”, e não é por mero acaso que ele ocupa também território do Iraque.

Ali Kamel termina seu livro com os parágrafos que Mario Sabino publicou em O Antagonista, mas, algumas linhas antes, o autor escreveu: “As analogias [da Guerra do Iraque] com o Vietnã são muitas e muito do agrado dos que buscam explicações fáceis. Mas as diferenças são as que importam: o inimigo ali era ateu, racional e sabedor das próprias limitações. O inimigo hoje acredita que fala com Deus, e que, por isso, os limites são apenas de fé insuficiente. Para eles, o apocalipse não é o fim do mundo, mas apenas uma verdade revelada, inescapável, anunciadora do início do Reino dos Céus na Terra. O mundo não se dá conta de que, para o suicida em busca do Paraíso, não há diferença entre morrer para matar dezenas ou morrer para matar milhares. A diferença está apenas no poder da bomba com que se explode.”

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